sábado, 15 de janeiro de 2011

FAZ HOJE 91 ANOS



MADRUGADAS

I


Em toda a noite o sono não veio. Agora
Raia do fundo
Do horizonte, encoberta e fria, a manhã.
Que faço eu no mundo?
Nada que a noite acalme ou levante a aurora,
Coisa séria ou vã.


Com olhos tontos da febre vã da vigília
Vejo com horror
O novo dia trazer-me o mesmo dia no fim
Do mundo e da dor –
Um dia igual aos outros, da eterna família
De serem assim.


Nem o símbolo ao menos vale, a significação
Da manhã que vem
Saindo lenta da própria essência da noite que era,
Para quem,
Por tantas vezes ter sempre ‘sperado em vão
Já nada 'spera.


FERNANDO PESSOA, 15 DE JANEIRO DE 1920

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