sábado, 29 de janeiro de 2011

FAZ HOJE 90 ANOS



Cumpre a lei, seja vil ou vil tu sejas.
Pouco pode o homem contra a externa vida.
Deixa haver injustiça.
Nada mudas que mudas.
Não tens mais reino do que a própria mente.
Essa, em que és dono, grato o Fado e os Deuses,
Governa até à fronteira
Onde mora a verdade.
Aí, ao menos, só por inimigos
Os grandes deuses e o Destino ostentas.
Não há dupla derrota
De derrota e vileza.
Assim penso, e esta mórbida justiça
Com queremos intervir nas coisas,
Expilo, como um servo
Infiel da ampla mente.
Se nem de mim posso ser dono, como
Quero ser dono ou lei do que acontece
Onde me a mente e o corpo
Não são mais do que coisas?
Basta-me que me baste, e o resto gire
Na órbita prevista, em que até os deuses
Giram, centros servos
De um movimento imenso.

RICARDO REIS, 29 DE JANEIRO DE 1921


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