Talvez não seja mais do que o meu sonho...
Esse sorriso será para outro, ou a propósito de outro,
Loura débil...
Esse olhar para mim casual como um calendário...
Esse agradecer-me quando a não deixei cair do eléctrico..
Um agradecimento...
Perfeitamente...
Gosto de lhe ouvir em sonho o seguimento que não houve
De conversas que não chegou a haver.
Há gente que nunca é adulta na prática!
Creio mesmo que pouca gente chega a ser adulta - prática -
E a que chega a ser adulta e prática morre sem dar por nada.
Loura débil, figura inglesa absolutamente portuguesa,
Cada vez que te encontro lembro-me dos versos que esqueci...
É claro que não me importo nada contigo
Nem me lembro de te ter esquecido senão quando te vejo,
Mas o encontrar-te dá som ao dia e ao desleixo
Uma poesia de superfície.
Uma coisa a mais no a menos da improficuidade da vida...
Loura débil, feliz porque não és inteiramente real,
Porque nada que vale a pena ser lembrado é inteiramente real,
E nada que vale a pena ser real vale a pena.
ÁLVARO DE CAMPOS 25 DE JANEIRO DE 1929
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