quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

FAZ HOJE 79 ANOS

NOTAS SOBRE TAVIRA


Cheguei finalmente à vila da minha infância.

Desci do comboio, recordei-me, olhei, vi, comparei.

(Tudo isto levou o espaço de tempo de um olhar cansado)

Tudo é velho onde fui novo.

Desde já – outras lojas, e outras frontarias de portadas nos mesmos prédios –

Um automóvel que nunca vi (não os havia antes)

Estagna amarelo escuro ante uma porta entreaberta.

Tudo é velho onde fui novo.

Sim, porque até o mais novo que eu é ser velho o resto.

A casa que pintaram de novo é mais velha porque a pintaram de novo,

Paro diante da paisagem, e o que vejo sou eu.

Outrora aqui antevi-me esplendoroso aos 40 anos –

Senhor do mundo –

É aos 41 que desembarco do comboio involuntário.

O que conquistei? Nada.

Nada, aliás, tentei conquistar.

Trago o meu tédio e a minha falência a pesar-me mais na mala…

De repente avanço seguro, resolutamente.

Passou toda a minha hesitação.

Esta vila da minha infância é afinal uma cidade estrangeira.

(Estou à vontade, como sempre, perante o estranho, o que me não é nada)

Sou forasteiro, tourist, transeunte.

É claro: é isso que sou.

Até em mim, meu Deus, até em mim.




ALVARO DE CAMPOS, 8 DE DEZEMBRO DE 1931

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