É um campo verde e vasto,
Sozinho sem saber,
De vagos gados pasto
Sem águas a correr.
Só campos, só sossego,
Só solidão calada.
Olho-o e nada nego
E não afirmo nada.
Aqui em mim me exalço
No meu fiel torpor.
O bem é frouxo e falso,
O mal é erro e dor.
Agir é não ter casa,
Pensar é nada ter.
Aqui nem brisa ou asa
Nem razão para a haver.
E um vago sono desce
Só por não ter razão,
E o mundo alheio esquece
À vista e ao coração.
Torpor que alastra e excede
O campo e o gado e os ver.
E a alma nada pede
E o corpo nada quer.
Feliz sabor de nada,
Insciência do mundo,
Aqui sem ponte ou estrada,
Nem horizonte ao fundo.
FERNANDO PESSOA, 24 DE JANEIRO DE
1933
Sem comentários:
Enviar um comentário