terça-feira, 12 de abril de 2011

FAZ HOJE 83 ANOS

DEMOGORGON


Na rua cheia de sol vago há casas paradas e gente que anda.
Uma tristeza cheia de pavor, esfria-me.
Pressinto um acontecimento  do lado de lá das frontarias e dos movimentos.
Não, não, isso não!
Tudo menos saber o que é o Mistério!
Superfície de universo, ó Pálpebras Descidas,
Não vos ergais nunca!
O olhar de Verdade Final não deve poder suportar-se!


Deixai-me viver sem saber nada, e morrer sem ir saber nada!
A razão de haver ser, a razão de haver seres, de haver tudo,
Deve trazer uma loucura maior que os espaços
Entre as almas e entre as estrelas.


Não, não, a verdade não! Deixai-me estas casas e esta gente,
Assim mesmo, sem mais nada, estas casas e esta gente...
Que bafo horrível e frio me toca em olhos fechados?
Não os quero abrir de viver!
Ó Verdade, esquece-te de mim!


ÁLVARO DE CAMPOS, 12 DE ABRIL DE 1928

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