quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

POEMA SEM DATA




O descalabro a ócio e estrelas...
Nada mais...
Farto...
Arre...
Todo o mistério do mundo entrou para a minha vida económica.
Basta!...
O que eu queria ser, e nunca serei, estraga-me as ruas.
Mas então isto não acaba?
É destino?
Sim, é o meu destino
Distribuído pelos meus conseguimentos no lixo
E os meus propósitos à beira da estrada —
Os meus conseguimentos rasgados por crianças,
Os meus propósitos mijados por mendigos,
E toda a minha alma uma toalha suja que escorregou para o chão.
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O horror do som do relógio à noite na sala de jantar de uma casa de província —
Toda a monotonia e a fatalidade do tempo...
O horror súbito do enterro que passa
E tira a máscara a todas as esperanças.
Ali...
Ali vai a conclusão.
Ali, fechado e selado,
Ali, debaixo do chumbo lacrado e com cal na cara
Vai, que pena como nós,
Vai o que sentiu como nós,
Vai o nós!
Ali, sob um pano cru acro e horroroso como uma abóbada de cárcere
Ali, ali, ali… E eu?

ÁLVARO DE CAMPO, SEM DATA


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