Deixei de ser aquele que
esperava...
Isto é, deixei de ser
quem nunca fui.
Entre onda e onda a onda
não se cava,
E tudo em seu conjunto,
dura e flui.
A seta dorme, inerme, na
ampla aljava.
O presente ao futuro
cria e imbui.
Se os mares erguem sua
fúria brava
É que a futura paz seu
ritmo obstrui.
Tudo depende do que não
existe.
Por isso meu ser mudo se
converte
Na própria semelhança
austera e triste.
Nada me explica. Nada me
pertence.
E sobre tudo a lua
alheia verte
A luz que tudo usurpa e
nada vence.
FERNANDO PESSOA, 10 DE
FEVEREIRO DE 1933
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