segunda-feira, 17 de dezembro de 2018



A barca dos meus sentidos
Voga, com remos perdidos,
Por este mar sem ruídos -

Por este mar sem plagas
Cujas doloridas vagas
Ó tédio vão, tu afagas;

À sombra da minha prece
Minha alegria fenece
E além o sol da alma desce.

Crepúsculo interior
Alma sem nexo e sem cor
Sem ter vida nem amor...

Voga sem remos nem velas,
Por este mar sem procelas,
Sob este céu sem estrelas,...

Voga com perdidos remos
Por este mar onde temos
(...) que perdemos.

Cinza de ociosa incerteza
Que quer seja ou não seja
E não usa ter tristeza;

Que não tem força p'ra ter
Tédio que seja viver
E nem anseia morrer.





FERNANDO PESSOA, 17 DE DEZEMBRO DE 1912


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