segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

FAZ ESTE MÊS 100 ANOS


ANÁLISE


Tão abstracta é a ideia do teu ser
Que me vem de te olhar, que, ao entreter
Os meus olhos nos teus, perco-os de vista,
E nada fica ao meu olhar, e dista
Teu corpo do meu ver tão longamente,
E a ideia do teu ser fica tão rente
Ao meu pensar olhar-te, e ao saber-me
Sabendo que tu és, que, só por ter-me
Consciente de ti nem a mim sinto.
E assim neste ignorar-me a ver-te, minto
À ilusão da sensação, e sonho
Não te vendo, nem vendo, nem sabendo
Que te vejo, ou sequer que sou, risonho
Do interior crepúsculo tristonho
Em que me sinto que sonho o que me sinto sendo.


FERNANDO PESSOA, DEZEMBRO DE 1911

Sem comentários: