Não! Só quero a liberdade!
Amor, glória, dinheiro são prisões.
Bonitas salas? Bons estofos? Tapetes
moles?
Ah, mas deixem-me sair para ir ter
comigo.
Quero respirar o ar sozinho,
Não tenho pulsações em conjunto,
Não sinto em sociedade por quotas,
Não sou senão eu, não nasci senão
quem sou, estou cheio de mim.
Onde quero dormir? No quintal...
Nada de paredes - só o grande
entendimento -
Eu e o universo,
E que sossego, que paz não ver antes
de dormir o espectro do guarda-fato
Mas o grande esplendor, negro e
fresco de todos os astros juntos,
O grande abismo infinito para cima
A pôr brisas e bondades do alto na
caveira tapada de carne que é a minha cara,
Onde só os olhos - outro céu -
revelam o grande ser subjectivo.
Não quero! Dêem-me a liberdade!
Quero ser igual a mim mesmo.
Não me capem com ideais!
Não me vistam as camisas-de-forças
das maneiras!
Não me façam elogiável ou
inteligível!
Não me matem em vida!
Quero saber atirar com essa bola
alta à lua
E ouvi-la cair no quintal do lado!
Quero ir deitar-me na relva,
pensando "amanhã vou buscá-la..."
Amanhã vou buscá-la ao quintal ao
lado...
Amanhã vou buscá-la ao quintal ao
lado...
Amanhã vou buscá-la ao quintal
Buscá-la ao quintal
Ao quintal
Ao lado...
ÁLVARO DE CAMPOS, 11 DE AGOSTO DE 1930
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