terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

FAZ HOJE 82 ANOS



Traz o jornal que ontem morreste. 
Sobre os joelhos o deponho 
E numa náusea em que estou triste 
Entristeço, relembro, sonho. 

As longas noites rememoro
De vãs conversas e ocioso estudo, 
E, com minha alma, opresso, choro 
O nada temporal de tudo. 

Custa a crer que não hajas. Vai 
Pôr-se entre nós o grande muro 
Que com a porta onde se sai 
Existe a fazer tudo escuro. 

E estes versos são o disfarce 
Do egoísmo que me humano faz. 
Rimo a dor de que tudo passe, 
Sorrio. Já te esqueci, rapaz. 

Mas ah, conheço claro em mim! 
Não é a ti que choro, nem 
A sorte abstracta que fez fim: 
Mas que eu hei-de morrer também. 

É medo o que me faz sentir, 
É a saudade de quem sou 
Que como um farol vem luzir 
Na morte para onde vou. 

FERNANDO PESSOA, 12 DE FEVEREIRO DE 1931

Sem comentários: