Traz o jornal que ontem morreste.
Sobre os joelhos o
deponho
E numa náusea em que
estou triste
Entristeço, relembro,
sonho.
As longas noites
rememoro
De vãs conversas e
ocioso estudo,
E, com minha alma,
opresso, choro
O nada temporal de
tudo.
Custa a crer que não
hajas. Vai
Pôr-se entre nós o
grande muro
Que com a porta onde
se sai
Existe a fazer tudo
escuro.
E estes versos são o
disfarce
Do egoísmo que me
humano faz.
Rimo a dor de que
tudo passe,
Sorrio. Já te
esqueci, rapaz.
Mas ah, conheço claro
em mim!
Não é a ti que choro,
nem
A sorte abstracta que
fez fim:
Mas que eu hei-de
morrer também.
É medo o que me faz
sentir,
É a saudade de quem
sou
Que como um farol vem
luzir
Na morte para onde
vou.
FERNANDO PESSOA, 12 DE FEVEREIRO DE 1931
Sem comentários:
Enviar um comentário