Minha vida tem sido, em suma,
Reles e obscura,
Sem ventura nem desventura,
Sombras de trapos na bruma.
Como um caixeiro tenho ficado
A um balcão nulo,
Como acontece isto ao amante Catulo
Nem a poeta, conselheiro de Estado.
Até quando me amaram
Parece que me ofendiam.
Do casaco de gente com que me albardaram
Até os botões caíam.
Hoje estou calmo, um pouco certo,
Um tanto ou quanto já eu
E olho, passado, o portão aberto,
Mas digo sempre: 'não é meu'.
FERNANDO PESSOA, 24 DE JULHO DE 1931
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