Tantos poemas contemporâneos!
Tantos poetas absolutamente de hoje
-
Interessante tudo, interessante
todos...
Ah, mas é quase tudo...
É tudo vestíbulo
É tudo só para escrever...
Nem arte,
Nem ciência
Nem verdadeira nostalgia...
Este olhou bem o relevo desse
cipreste...
Esse viu bem o poente por trás do
cipreste...
Este reparou bem na emoção que tudo
isso daria...
Mas depois?...
Ah, meus poetas, meus poemas - e
depois?
O pior é sempre o depois...
É que para dizer é preciso pensar -
Pensar com o segundo pensamento -
E vocês, meus velhos, poetas e
poemas,
Pensam só com a rapidez primária da
asneira - é [...] e da pena -
Mais vale o clássico seguro,
Mais vale o romântico cantante,
Mais vale qualquer coisa, ainda que
má,
Que os arredores inconstruídos duma
qualquer coisa boa ...
'Tenho a minha alma!'
Não, não tens: tens a sensação dela.
Cuidado com a sensação!
Muitas vezes é dos outros,
E muitas vezes é nossa
Só pelo acidente estonteado de a
sentirmos...
ÁLVARO DE CAMPOS, 30 DE NOVEMBRO DE 1934
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