Sossego enfim. Meu coração deserto
Nada espera da inútil caravana.
Pouco a pouco meu spírito se irmana
Com ter perdido o próprio saber
incerto.
É sempre além de mim o indescoberto
Porto ao luar com que se o sonho
engana.
De imperceptível o sonho, plana
Para a vida a este desacerto.
Estagno a lagos de algas por achar,
Sinto vogar o barco das amadas.
A noite despe não haver o luar
E como um filtro de horas encantadas
Tremem os rios, gelam as estradas
No absurdo vácuo de eu não ter que
amar.
FERNANDO PESSOA, 3 DE DEZEMBRO DE
1917
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