terça-feira, 10 de maio de 2016

FAZ HOJE 87 ANOS



Meu coração, mistério batido pelas lonas dos ventos...
Bandeira a estralejar desfraldadamente ao alto,
Árvore misturada, curvada, sacudida pelo vendaval,
Agitada como uma espuma verde pregada a si mesma,
(...)
Para sempre condenada à raiz de não se poder exprimir!
Queria gritar alto com uma voz que dissesse!
Queria levar ao menos a outro coração a consciência do meu!
Queria ser lá fora...
Mas o que sou? O trapo que foi bandeira,
As folhas varridas para o canto que foram ramos,
As palavras socialmente desentendidas, até por quem as aprecia,
Eu o que quis fora a minha alma inteira,
E ficou só o chapéu do mendigo debaixo do automóvel,
Estragado estragado,
E o riso dos rápidos soou para trás na estrada dos felizes...

ÁLVARO DE CAMPOS, 10 DE MAIO DE 1929


Sem comentários: