Não quero pedir nada ao
fado e à vida.
Nada vale pedir-lhes,
porque são
Dependentes de uma outra
coisa ida
Que não lhes deixou
forma nem razão.
Para que hei eu de pedir
glória ou esmola
A quem não tem licença
para ser?
O ar suficientemente me
consola
Por existir, e o campo
com o ver.
Não, nada peço. Quando a
prece é inútil
Ë prolixo o mais curto
do rezar.
Se a natureza é assim
tão falsa e fútil
De que serve sentir,
crer ou pensar?
Há ramos altos cuja
sombra espalha
Um sossego de fresco
sobre nós,
E há um som de água, que
ao cair da calha,
Nos faz mais sonolentos
e mais sós.
Isso sim, isso... O
resto é o que o mundo
Tem por glória ou amor
ou isenção.
FERNANDO PESSOA, 19 DE
SETEMBRO DE 1934
Sem comentários:
Enviar um comentário