FAZ HOJE 106 ANOS
A UM REVOLUCIONÁRIO MORTO
Ele aí jaz em plena paz.
Já nada faz nem quer...
Deixem que gele... Acabou p'ra ele
já
O amor à pele e o amor da mulher.
Combateu bem sem saber por quem
Ou por quê, e aí têm... assim
E ei-lo aí que dorme o tal sono
enorme
Que o fará disforme... E o fim do
fim...
Com cega ânsia bruta caiu na luta
Não há vinho ou puta p'ra ele já
Talvez que no violento último
momento
Ao cair (...)
Vivesse mais vida, mas toda vivida
P'ra quê lamentá-lo?
Talvez a vitória seja a morte, e a
glória
Seja ser só memória disso
E talvez vencer seja mais morrer
Que sobreviver... Que é a morte? É
ocaso...
A vida é só tê-la, vivê-la e
perdê-la
De morte vivê-la. Foi o que este
fez.
Num grito e num tiro, deu-lhe tudo
um giro
Lançou um suspiro e era uma vez...
Nós que vamos pondo razões e
cumprindo
Causas e supondo (...)
Estamos mais no certo que esta besta
E talvez o melhor... Seja lá o que
for
A vida voltou, ele é o que é...
Lutemos sem ver da morte o mal que
brada
Lá a vida é nada. Tenhamos fé.
(...)
FERNANDO PESSOA, 18 DE FEVEREIRO DE
1913
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