Há doenças piores que as
doenças,
Há dores que não doem, nem
na alma,
Mas que são dolorosas mais
que as outras.
Há angústias sonhadas mais
reais
Que as que a vida nos traz,
há sensações
Sentidas só com o
imaginá-las
Que são mais nossas do que
a nossa vida.
Há tanta cousa que, sem
existir,
Existe, existe
demoradamente,
E demoradamente é nossa e
nós...
Por sobre o verdor turvo do
amplo rio
Os circunflexos brancos das
gaivotas...
Por sobre a alma o adejar
inútil
Do que não foi, nem pôde
ser, e é tudo.
Dá-me mais vinho, porque a
vida é nada.
FERNANDO PESSOA, 19 DE
NOVEMBRO DE 1935
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