domingo, 24 de junho de 2012

FAZ HOJE 77 ANOS




Estou cansado, é claro,
Porque a certa altura, a gente tem de estar cansado.
De que estou cansado não sei.
De nada serviria sabê-lo
Pois o cansaço ficaria na mesma,
A ferida dói como dói
E não em função da causa que a produziu.
Sim, estou cansado,
E um pouco sorridente
De o cansaço ser só isto -
Uma vontade de sono no corpo,
Um desejo de não pensar na alma,
E por cima de tudo uma tranquilidade lúcida
Do entendimento retrospectivo...


E a luxúria muda de não ter já esperanças?


Sou inteligente: eis tudo.
Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto,
E há um certo prazer até no cansaço que isto nos dá,
Que a final a cabeça serve para qualquer coisa.


ÁLVARO DE CAMPOS, 24 DE JUNHO DE 1935

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