
Na nuvens brancas que lentam
Quando a chuva está à espera
A luz do sol faz uma orla
Que amarela e reverbera.
Parece aquele ouro que orla
Os panos para o caixão.
Salvo que as nuvens são brancas
E pretos os panos são.
Mas a verdade é a mesma
Por um mistério da vida
Por isso o ouro orla as nuvens
E os panos da despedida.
Nuvens brancas, panos negros,
Por mais que o queiram cobrir,
O mistério transparece
E orla-os de luz a sorrir.
Porque, enfim, o branco alegre
Ou o preto triste são
Cousa que o sol cria e mata
Na sua circunscrição.
FERNANDO PESSOA, 20 DE MARÇO DE 1931
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